Riachão – A perda da memoria histórica: um grande risco

Riachão – A perda da memoria histórica: um grande risco

Ontem, faleceu de causa natural o cantor e compositor Riachão (1921-2020) com seus 98 anos de idade. Conseguiu “se sair” da pandemia do corona vírus.

Em certas sociedades africanas se diz.. . quando morre um idoso é como se perdêssemos uma biblioteca . Nessa onda de pandemia do corona vírus muitos idosos estão indo embora? Será que estamos perdidos?
Riachão faleceu em Salvador em sua residência no bairro do Garcia, junto aos seus familiares e por causa natural. Um dia apos a cidade de Salvador completar 471 anos.


Riachão, nascido e criado no Garcia, território negro da região central da cidade de Salvador era um dos mais reconhecidos sambistas populares do país. Autodidata e apaixonado pelo samba. Um exemplo de sagacidade e inteligência cultural. Ele mesmo dizia que “compunha de cabeça” suas canções. Não rascunhava as letras das canções e guardava tudo na memoria.

Dono de um pensamento irreverente, critico e altamente perceptivo ao modo de vida do negro sofredor. Ao mesmo tempo em que suas letras e sambas nos relembram as delicias do modo de ser da cultura negra baiana.
Riachão recebe muitas homenagens. A cultura popular concedeu ao Sr Clementino Rodrigues, mais conhecido pelo apelido de Riachão, o titulo de mestre do samba sem nunca ter ido à universidade. Quase cem anos de vida e muita sabedoria. Temos muito que aprender com os mais velhos. Eles são uma biblioteca de conhecimento. Respeite o idoso. Desenvolva politicas publicas respeitando o estatuto do idoso.O poder publico soteropolitano reconheceu parte da importância e dedicação de Riachão à vida cultural da cidade. Em 2016 oficializou com seu nome Riachão, o circuito tradicionalmente chamado de Mudança do Garcia.


A Mudança do Garcia é uma grande movimentação popular carnavalesca. Um bloco carnavalesco popular que surgiu há mais de 80 anos se concentrava no fim de linha do Garcia e desfilava nas ruas do bairro do Garcia até a passarela carnavalesca do Campo Grande apelidado Circuito Osmar. Desde então o bloco reúne trabalhadores e trabalhadoras de toda cidade e muitos turistas.


As alegorias, o samba, a alegria, a irreverencia popular e a figura de Riachão do alto do famoso sobrado da família anima o circuito Riachão, tradicionalmente, frequentado nas segundas feiras de carnaval; Eles sempre estava lá acenando a todos da “mudança do Garcia”.
Dentre as muitas homenagens… Depositamos também a gratidão da Soweto.
Muito orgulho de ter Riachão no panteão do samba e da historia da cultura brasileira.


Uma personalidade negra popular de grande expressão cultural. Um amigo de todos e todas que acompanham o evento carnavalesco “mudança do Garcia”. Uma trajetória irreverente contra o racismo e a sociedade autoritária.
Riachão foi um idoso que nos deixou grandiosa experiência de vida e muita historia para contar. Quem o conheceu pode contar. Essa historia é tudo verdade.


Na cultura negra a oralidade é uma tradição e um instrumento continuo capaz de guardar a memoria afetiva, amiga, solidaria histórica e irreverente do protesto negro nas ruas. O dialogo Inter geracional flui melhor por que há reconhecimento e pertencimento cultural. A oralidade é uma importante fonte histórica e exige técnica e verdade para reconstituição do passado. Naquela circunstancia não há risco de perda da memoria histórica toda a vez que a exemplo de Riachão se é popular, se guarda a tradição e consegue encarar a modernidade. O grande desafio é a transmissão deste conhecimento de forma sincera e antirracista quer seja através da escrita, da pesquisa ou da arte em geral.
Riachão! Va em paz e aqui a luta continua.


Diretoria e parceiros da Soweto Organização Negra
Xô… Xô… corona para nosso bem viver…Fique em casa. Conheça o saber das mais velhas e dos mais velhos.

Texto organizado livremente por Gevanilda Santos.

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