FEMENAGEM as assistentes sociais: 15 de maio
MAJÔ
No Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) da Guia, todas as 4ª feiras é dia de reunião de acolhida, na porta de entrada o cartaz fixo anuncia a programação semanal e os critérios.
Cartaz: Reunião de Acolhida – 4ª feira às 14h – máximo de 15 participantes, tolerância de 15 minutos.
O equipamento fica no centro do bairro, entre duas favelas, bem distante do centro da cidade, aproximadamente 40 minutos de carro até a prefeitura e a secretaria de assistência social.
Nada por ali acontece sem ser visto por grupos de interesses; o secretário da assistência, um conhecido político e empresário da cidade, aparecem na região com frequência.
A equipe que trabalha no CRAS é bem conhecida da população, tudo acontece dentro das regularidades estabelecidas. Uma vez por mês acontece o famoso café da manhã do secretário, é uma fartura só, tem suco e refrigerante, doces e salgados. No meio da fartura, da confraternização antes das fotos oficiais, ele sempre faz um discurso:
_Faço questão de vir aqui conversar com vocês, povo acolhedor, vocês não são pobres, não são, pense nisso. Aqui o povo é rico, rico das graças de Deus, essa comunidade mora no meu coração, aqui o povo é unido, trabalhador e tem Deus no coração.
A coordenadora não fala nada, diz que não é técnica e não quer atrapalhar. Ela está no cargo por duas gestões seguidas e é a pessoa de confiança no meio político. Aceita as regras de todos os lados; quando a equipe reclama das condições de trabalho ela concorda e diz que vai fazer o possível para solucionar, nas semanas seguintes oferece pequenos mimos e diz:
_Enquanto esperamos a solução dos problemas, que inclusive já conversei com o secretário, vamos mimar o coração, saibam que estou sempre com vocês.
O território é bem específico, uma densidade demográfica alta, o mais distante do centro, com uma renda média de ½ salário-mínimo. A maioria das pessoas estão desempregadas ou trabalham no mercado informal. Outra marca da região é o alto índice de homicídio; no bairro tem um CRAS, duas escolas e um posto de saúde.
A assistente social é considerada a estressada da equipe. Posta no WhatsApp frases revolucionárias, não participa do café com o secretário e sempre está em desacordo com a gerente. No último mês a discussão entre as duas chegou aos ouvidos das chefias, a própria assistente social, ligou e falou que não dava mais para ficar ali, já estava há muito tempo trabalhando no CRAS, sentia-se cansada.
O estopim da briga foi em decorrência da ordem da gerente que determinou as novas regras para atendimento ao público:
_Na reunião de coordenadores a diretora determinou que nosso CRAS terá duas reuniões por semana com o máximo de pessoas possível.
_ Ah! Vamos ganhar um computador com internet, o secretário comprou com o próprio salário.
A assistente social ameaçou denunciar por atitudes antiéticas, falta de respeito à população e por ser uma prática com interesses políticos.
Foi à única vez que a coordenadora do CRAS levantou a voz:
_ Você quer é me prejudicar, eu que sempre fiquei do lado da equipe técnica, nunca quis saber o que faz ou deixa de fazer uma assistente social.
_ Nossa! Parece até que você não ama as pessoas.
Os demais funcionários algumas vezes manifestavam opinião outras vezes se calavam.
A assistente social foi chamada para uma conversa com a supervisora que não é formada na área das ciências humanas. A conversa não foi amigável, mas tudo ficou nos seus devidos lugares:
_ Aqui todo mundo sabe a sua função, o governo está trabalhando para deixar um legado, foi à gestão com maior índice de aprovação que se tem notícias, veja, por exemplo, você não sabe, mas o CRAS que você trabalha, além de ser o maior em dimensão e densidade territorial, atende quase a totalidade da população.
No café com o secretário, superamos a meta do número de atendimentos/mês.
Digo com orgulho e o prefeito sabe disso:
_ É uma equipe pequena, confesso, desfalcada, mas trabalham por dez, isso é emocionante, (tira o lenço de linho do bolso e seca as lágrimas), _ desculpa.
_ Eu me orgulho tanto de você, uma guerreira, uma das melhores assistentes sociais da prefeitura. _ O secretário e eu conhecemos sua história, uma mulher com força e coragem de homem.
Depois de 30 minutos ininterruptos de conversa, que só a diretora falava, suspirou, olhou nos olhos da assistente social com ar de afeto e disse:
_ Miga, quer falar mais alguma coisa?
Com medo da resposta a assistente social perguntou:
_ O café da manhã com o secretário entra como atendimento?
_ Entra sim, não se preocupe, alias, digo mais, ele vai ampliar essa prática para os demais CRAS, ou melhor, _ essa é uma proposta minha, para todos os serviços da assistência.
Despediram-se sem nenhum compromisso.
Na semana seguinte a assistente social teve uma crise de torcicolo mesmo assim foi trabalhar por que tinha reunião com um grupo de mulheres.
A coordenadora, com tom afetuoso, disse:
_ Nossa…. sabe que isso é tensão, estresse… precisa malhar amiga.
Augusta Santo
Esse conto faz parte de um projeto de coletânea de contos que fala do Serviço Social e do AssistenteSocial, em homenagem às mulheres, cada conto tem um nome de uma mulher.
Sobre a autora: Augusta Nunes é assistente social, faz parte do Grupo de Estudos das Relações Etnico raciais no Serviço Social (GERESS)
DIA 15 DE MAIO
DIA DO ASSISTENTE SOCIAL
Neste 15 de Maio lamentamos o cenário caótico de saúde pública que o planeta em geral e a sociedade brasileira, em particular, atravessa em função do Coronavirus. As assistentes sociais, assim como tantos outros trabalhadores e trabalhadoras, estão na linha de frente no atendimento das famílias, principalmente aquelas que se encontram na linha da pobreza ou da extrema pobreza, pessoas pretas e pardas que engrossam as fileiras dos necessitados/as e dos/as contaminados/as pelo vírus.
Muitas/os assistentes sociais passaram a trabalhar na entrega de cestas básicas nas diversas comunidades, histórias de vida dramáticas são relatadas pelos/as moradores aos profissionais que estão lidando com a árdua tarefa de verificar quem está ou não cadastrado para receber a cesta básica além de terem que seguir as determinações do poder dominante que exige registro fotográfico das famílias miseráveis no ato do recebimento da cesta básica.
Em tempos de pandemia, o trabalho das/os assistente sociais está marcado pelo esgotamento físico e mental, o temor de contaminar ou ser contaminado pelo vírus, relações de trabalho exploratórias que já existiam, e que agora se acentuaram, falta de estrutura básica com espaços de atendimento inadequados, e o atendimento de exigências políticas totalmente descabidas frente a situação de calamidade pública atual.
No que se refere ao cotidiano do trabalho das/os assistentes sociais, a pandemia escancarou o quanto as medidas de proteção social assim como as políticas sociais voltadas para a população de baixa renda, sejam elas no âmbito da saúde, habitação, trabalho, cultura, entre outras, são falhas e de fato, não promovem a mobilidade social e não garantem o bem-estar das famílias que se encontram na linha da pobreza e extrema pobreza. Para as/os assistentes sociais, trabalhar com essa faixa da população é um desafio uma vez que não há investimentos financeiros suficientes e nem vontade política para que as políticas públicas sejam verdadeiramente efetivadas e tirem a população da condição de sub-humanidade e não seja lembrada apenas com fins eleitorais.
Apesar da difícil conjuntura, temos o que comemorar, por exemplo, a realização da campanha Serviço Social no Combate ao Racismo da gestão (2017-2020) do conselho federal e conselhos regionais de Serviço Social e a instituição do Comitê de Combate ao Racismo pelos conselhos regionais. No período da campanha ocorreram seminários, debates, oficinas e cursos de formação para docentes na temática etnicorracial. O reflexo da campanha materializou-se também durante o 16º Congresso Brasileiro de Serviço Social (CBAS) que aconteceu em 2019, as mesas de debate pautaram e procuraram aprofundar e desmistificar o mito da democracia racial presente na formação profissional.
Parabéns a todas/os assistentes sociais, nossa luta continua durante e na pós pandemia.
SEGUEM ALGUMAS INFORMAÇÕES IMPORTANTES SOBRE O SERVIÇO SOCIAL
O dia 15 de maio foi o dia em que foram regulamentados e instituídos os instrumentos normativos e de fiscalização da profissão, na época pelo Conselho Federal e Regional de Assistentes Sociais, por isso a data passou a ser reconhecida como o dia do Assistente Social, embora a profissão tenha sido reconhecida legalmente em 1957.
Quem são os/as assistentes sociais?
De acordo com dados que datam de 2016[1], a maioria das graduadas em Serviço Social são mulheres e mulheres negras (pardas e pretas).
São profissionais que cursaram uma faculdade de Serviço Social (reconhecida pelo Ministério da Educação) e possuem registro no Conselho Regional de Serviço Social (CRESS) do estado em que trabalham. A profissão é regida pela Lei Federal 8.662/1993, que estabelece suas competências e atribuições. São Paulo foi a cidade que criou a primeira escola de Serviço Social no Brasil em 1936.[2]
O que fazem?
Analisam, elaboram, coordenam e executam planos, programas e projetos para viabilizar os direitos da população e seu acesso às políticas sociais, como a saúde, a educação, a previdência social, a habitação, a assistência social e a cultura. Analisam as condições de vida da população e orientam as pessoas ou grupos sobre como ter informações acessar direitos e serviços para atender às suas necessidades sociais. Assistentes sociais elaboram também laudos, pareceres e estudos sociais e realizam avaliações, analisando documentos e estudos técnicos e coletando dados e pesquisas. Além disso, trabalham no planejamento, organização e administração dos programas e benefícios sociais fornecidos pelo governo, bem como na assessoria de órgãos públicos, privados, organizações não governamentais (ONG) e movimentos sociais. Assistentes sociais podem ainda trabalhar como docentes nas faculdades e universidades que oferecem o curso de Serviço Social. As competências e atribuições privativas dessa categoria profissional estão previstas nos artigos 4º e 5º da Lei 8.662/1993.
Diferenças entre Assistente Social e Assistência Social
As vezes as pessoas referem-se ao assistente social usando o termo assistência social. Esclarecemos a distinção entre uma e outra:
Assistente Social é o/a profissional com nível superior que cursou a graduação em Serviço Social.
Assistência Social é uma política pública, assim como a política de saúde, educação, previdência social, habitação, entre outras. É um direito do cidadão e um dever do Estado, está prevista n樂威壯 a Constituição Federal de 1988. A Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) é que regulamenta a política de assistência social. Em 2005, é instituído o Sistema Único de Assistência Social – SUAS, que tem por função a gestão das ações da Assistência Social no campo da proteção social brasileira.
Autora: Suelma Ines de Deus Branco,
assistente social, membro da Soweto Organização Negra e do Grupo de Estudo das
Relações Etnicorraciais no Serviço Social (GERESS).
[1] http://download.inep.gov.br/educacao_superior/enade/relatorio_sintese/2016/servico_social.pdf
[2] http://cfess.org.br/arquivos/deliberacao3comunica-material-midia-POSNACIONAL-final.pdf