Coronavírus em Nova York

Coronavírus em Nova York

Junho 22, 2020 Comentários fechados em Coronavírus em Nova York By Soweto*#%!

Uma afro baiana nos conta o impacto da coronavírus em Nova York – EUA*

…”Reflexes de Nova Yorque – Meu nome é Eli, sou afro-baiana e moro em Nova Yorque há quase vinte anos. Quero relatar a experiencia de viver em New York no momento do epicentro do coronavirus nos Estados Unidos.

Começo a relatar a minha tristeza quando vi a cidade de New York, vibrante a qualquer hora do dia ou da noite se aquietar. A tristeza aumentou ao ver um amigo que eu amo muito, um amigo cheio de energia, de repente, cair doente por covid-19

Fiquei sem saber o que fazer ou o que dizer.

Penso que em momento de pandemia quando uma pessoa querida, alguém que amamos muito adoece a palavra o argumento fácil do “vai ficar tudo bem” logo desaparece e não encontramos mais sentido em dizer aquelas palavras. Não cola.

 A incerteza impera. Então a alternativa é chorar e chorar. Chorar bastante e confessar “aconteça o que acontecer estamos aqui”. “Estamos juntos! “. “Faremos o possível para ajudar você e nos ajuda”. Entender e sobrevive a essa pandemia.

A ansiedade afora. Eu e meu marido, o Harry, estamos vulneráveis.

Ele mais ainda porque há algum tempo adquiriu comodidades. Diariamente toma medicamentos.  Felizmente não tivemos problemas para adquirir os remédios.

O nosso problema é o isolamento. Se qualquer um de nós for infectado por coronavírus como ficar no isolamento social e manter a distância orientada se moramos no centro de New York em um apartamento minúsculo de poucos metros quadrados. Aqui em NY as ruas, parques e restaurantes são extensões das moradias.  Com a epidemia da coronavírus esses lugares fora da moradia recheados de territorialidades negras – como diz Milton Santos – não estão mais disponíveis. Esse é o problema! Como habitar num espaço físico tão pequeno?  Como realizar o home office? Como atender as orientações de saúde? Especialmente na primeira semana da pandemia quando começamos o “home office.

Continuo em isolamento e com mais tempo para pensar, imaginar e refletir eu indago: como é possível sobreviver em aprisionados em prisões?

Nos EUA a pandemia se alastrou por centenas de outras cidades e todas estão na mesma situação. 

Eu e meu marido não fomos contaminado e estamos conseguindo sobreviver. Mas o perigo é evidente. É estarrecedor o aumento do número dos contaminados e mortos. E ainda mais estarrecedor saber quem está morrendo. Aqui nos O EUA são os afro-americanos e os latinos. Em uma quantidade muito acima da proporcionalidade populacional. Em Louisiana, for exemplo, os afro-americanos são mais de 70% dos mortos embora representem cerca de 33% da população. Como explicar essa desproporcionalidade?

Eles anunciam que as vítimas da covid-19 são pessoas dos   grupos de risco, consumidores de bebida de alcoólica, fumante e consumidores de drogas. E não explicam porque em New York ou Louisiana quem mais morre são os afro-americanos, latinos e imigrantes. Eles são trabalhadores condutores dos ônibus, dos táxis, das ambulâncias, dos correios e os entregadores de comida. Atendentes dos serviços emergenciais. Infelizmente não podem se dar ao luxo de trabalhar em casa. Pra eles não tem isolamento social   e continuam expostos ao contágio da covid-19.   Eles e suas famílias estão expostos ao contágio todos os porque precisam ir para o trabalho.

É a velha desigualdade econômica e social demonstrando as graves consequências. É o resultado de políticas equivocadas. De políticas racistas.

Nesse aspecto os EUA os têm problemas seríssimos. Problemas arraigados e sistêmicos. Vivemos em um sistema que produz muita riqueza e ao mesmo tempo muita desigualdade social. Estou aqui em New York revendo a “oportunidade do sonho americano” e a reflexão que brota é…   como reconstruir esse país se não vejo ser plantadas sementes de mudanças? “…

*Depoimento de Eli foi enviada a SOWETO por rede social em abril 2020.

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