Queremos colocar nosso bloco na rua

Queremos colocar nosso bloco na rua

Setembro 7, 2022 Comentários fechados em Queremos colocar nosso bloco na rua By Soweto*#%!

No sete de setembro queremos colocar nosso bloco na rua *[1]

                                                                                                  GEVANIDA SANTOS *[2]

Antes precisamos dizer qual é o  nosso bloco. 

Depois  de  dois anos de isolamento social em atendimento ao enfrentamento a  pandemia da Covid 19 voltamos as atividades públicas  as festividades cívicas das comemorações nacionais  da independência do Brasil no dia 7 de setembro .Nesta data, geralmente, é feriado nacional,  vamos por nosso bloco na rua e  dizer que as festividades oficiais das datas cívicas, dos desfiles oficiais, das paradas militares, das mudanças do zoneamento  do trânsito nas grandes cidades e todas  mudanças decorrentes   não serão  encaradas como evento  festivo.

Chegamos ao bicentenário da independência do Brasil (7 de setembro 2022) e  os festejos não serão comemorados  como antes.  Sabe por que?  Na conjuntura do ano do bicentenário da independência  não temos nada a comemorar.

Traçaremos neste artigo algumas  linhas para contrapor, contextualizar e desdizer a  comemoração festiva da  efeméride do bicentenário da independência.

Para começar a desenrolar o assunto  indagamos o que fazer diante do clima festivo  da efeméride ? Primeiro identificar o caráter das festividades. Se são   alusivas apenas aos feitos da elite nacional e internacional? Nada a comemorar! Simplesmente por que  as efemérides  são classificadas em âmbito  nacional, mas de fato dizem respeito  apenas aos feitos das elites brasileiras.

Quem não foi   convidado /a para a   festada independência do Brasil?

Os fatos históricos e oficiais  da independência do Brasil em 1822 estão espalhados nos livros didáticos. O que não está escrito  e  tampouco  se  estimula   reflexão  é   a perspectiva da participação popular.

Quem não foi /a  convidado para a  festada independência do Brasil?  Podemos dizer que  os  trabalhadores/as negros e negras não foram a festa da independência porque estavam acorrentados ao trabalho forçado da escravidão. E até hoje  data do bicentenário da independência seguem acorrentados a o racismo, sub emprego , ao desemprego , alto  custo de vida,  ao machismo,  a fome e toda má  sorte de violência e intolerância.

No século XIX as mulheres brancas também não  compareceram, ao grito da independência porque o patriarcado  vigente não permitia as mulheres brancas  saírem  às ruas desacompanhadas .As   mulheres negras desde então continuam  acorrentadas à chefia da família, dedicadas aos cuidados de lavar, passar e cozinhar estão acorrentadas a toda má sorte de violência e sevicias sexuais patriarcais.  Os povos indígenas e seus sagrados lutavam contra à mentalidade jesuítica para se livrarem  do  extermínio   dos seus povos  e da expropriação das suas próprias terras.

Nos museus  relativos à independência ou nos lugares oficiais, cujo  lugar denota os valores das elites. A  classe  média  contempla  o quadro “Independência ou morte” do artista Pedro Américo de Figueiredo e Mello, datado do ano de 1888. A replica ou tela original representa   uma pintura, do heroísmo de Pedro I no processo da independência do Brasil, cuja  margens do riacho do Ipiranga  na cidade São Paulo o monarca bradou independência de Portugal ou a morte da nação brasileira.  O   projeto do nacionalismo exacerbado  se viabilizou com o Hino Nacional Brasileiro (1831) que imortalizou e popularizou o lugar da independência  ( as margens do riacho ) , o bairro ( Ipiranga) e a ideia /  da versão  da independência do Brasil .Só não compreende a  ausência da participação popular na independência do Brasil quem não quer.[3] A soberania da nação brasileira é outra questão , outro lado da mesma moeda a ser tratada em outro moimento.

Os  escolares mais perspicazes  compreenderam os bastidores da negociata da independência do Brasil e retrataram tal episódio em livros que não saem do universo acadêmico. No geral , nos  livros escolares oficiais esta história permaneça acrítica e recheada de mentiras napoleônicas . As mentiras históricas hoje são denominadas “ fake news”, cujo maior interesse é  apropriação  dos  fatos históricos nacionais e positivos para fazer valer o  modo de vida das elites.

Duzentos após o 7 de setembro de 1822  a elite , os  grupos socias dos mais ricos e o atual staff governamental  insistem em comemorar   o bicentenário da  independência   do Brasil. Os trabalhadores e trabalhadoras  negras, os homens e mulheres  indígenas e brancos empobrecidos   não tem nada a comemorar.  Não foram  os protagonistas da história. Na hipótese do protagonismo  popular nas guerras da independência  teríamos nos currículos escolares  fatos como  ocorrido  na  Guerra da Independência do Brasil na Bahia (1823) e  liderança feminina e popular  de  Maria Felipa de Oliveira da  cidade de Itaparica.  Nem no passado nem no presente temo o que comemorar.  Recapitular    os  fatos nacionais e os internacionais  nos ajudam a refletir e  deixaria cair a máscara da efeméride.

Que  história  você conhece ?

No  universo da   história não contada pela oficialidade há  processo histórico de vitória dos interesses das elites e derrota dos  interesses dos vencidos. Narrativas ocultadas na guerra de interesses das classes sociai  brasileiras, na chamada luta  de classe real e  ou ideológica. Na disputa  de interesse entre os grupos e personalidades da história dos vencidos  foi silenciada

E assim poucos conhecem determinadas versão da história. A  Lei 10639/2003 é  para auxiliar a implementação da história da África e história do negro /a  brasileiros  nas escolas.

Qual  episódio   histórico  dos vencidos  você conhece ?  O silencio e o apagamento  não permitiu que o processo histórico chegasse até o leitor/a.

O  que dizer da efeméride do primeiro centenário  da independência  (1922) senão falar da história não contada? A nação brasileira inventada após cem anos de independência continuou  caricatural e marcada por  interesses das elites,  aos grilhões do colonialismo, do imperialismo e das desigualdades sociais, entre elas, o racismo, o machismo e a pobreza generalizada.

A população  negra trabalhadora, geralmente as mulheres negras,   só adentrava os salões das festas  das mansões das elites , a sala de visita da Casa Grande assobradada pela porta da cozinha.

Em 1922, ano do primeiro centenário da independência, as elites brasileiras, à época, estavam mergulhadas e sufocadas pelos agentes revolucionários que atuavam pelo fim da escravidão, da lavoura monocultura exportadora do café, perfilados e em greve urbana  na incipiente industrialização e por aqueles/as  que saíam às ruas em busca da própria liberdade.  Da um google  para checar  os fatos.

A ideia da nação era uma invenção , uma abstração hegeliana das elites .  Nas efemérides oficias das elites os grilhões nacionais não foram quebrados. Tudo mais e de bom que que faria do Brasil uma  nação totalmente livre , conjuntamente  com sua  população,  foram esquecidos e jogados embaixo do tapete dos salões que celebravam a chegada da era moderna.

A Semana de Arte Moderna (1922) foi um pálido verniz cultural de modernidade.

A fundação do Partido Comunista do Brasil (1922) fundou a esperança na transformação da sociedade e nas forças da esquerda política.  A revolução Russa de 1917 e  o anarquismo, chegaram ao Brasil para a socorrer  os trabalhadores  empobrecidos  e recém-chegados  da Europa.  Chegaram  e foram engrossar e esquentar o caldeirão  da imigração branca europeia  o que se chamou de “movimento operário nacional” sem a inclusão do trabalhador nacional.

A concepção e entendimento do movimento operário, à luz do conhecimento etnocêntrico, não incorporou a mão de obra nacional e escravizada  apelidada de “lumpesinato”, e hoje denominada “vulnerável”.  A cultura de matriz africana só encontrou lugar quando aferreceu sua resistência negra. E pouco a pouco os/as  trabalhadores/as aprisionadas a extenuantes jornadas do  trabalho “pesado” , remuneração aviltada pelo desvalor do trabalho social dos negros e negra e  silenciados à base da “chibatada”, como nos recorda o marinheiro negro João Cândido (1922).  

O significado da Revolução Russa (1917), e a efervescência revolucionária em prol da transformação da sociedade  e o fim das desigualdades se aquietou.  A história  da greve está longe dos bancos escolares .  As inúmeras  tentativas populares de independência na África, na  América Latina e Caribe foram sufocadas  e , posteriormente , administradas segundo interesses endógeno. A independência do Brasil só ocorreu em 1889 com o processo  republicano  dos militares e após a lei  Aurea com o  fim oficial  da escravidão.

A estética cinematográfica trouxe ao público com muito atraso os  horrores Ku-Klux-Klan, expressão da supremacia branca norte americana que hoje se espalha por vários cantos..

É importante demarcar tais acontecimento  hoje denominados  a  história dos vencidos. Um novo olhar para os acontecimentos mundiais, auxiliam na reconfiguração da expressão “nada será como antes”.  Nos parece acertado chamar atenção do leitor para  a urgente releitura do protagonismo e da  resistência negra frente aos  interesses propositalmente  acobertados ou exacerbados  nas datas festivas  e de perfil conservador e cívico e não cidadão.

Será que temos o que comemorar?

Será que temos o que comemorar  nas   efemérides  cívicas do sete de setembro? A nossa resposta  é.. Não….No ano do bicentenário da independência, não há nada a comemorar. A  efeméride  festiva  do bicentenário da Independência do Brasil não passa de uma festa sem graça, com gente desengonçada, sem ritmo, sem som, sem alegoria e a alegria da cultura popular. Não anuncia nada de bom aos trabalhadores/ as  negros e negras e aos indígenas a população LGBTQI+ e não  veiculam  utopia nem a esperança no bem viver.

Qual  Independência queremos?

A história não contada é   todos os protagonistas e suas narrativas humanistas, liberais conservadores-tradicionais, os modos revolucionários e livres,  dentre outros. Quando o leitor atento adentra  os fatos ocultados nas efemérides  oficiais   compreendera e realidade e o fato s  nada honrosos por que dele jorrou sangue dos inocentes que bravamente lutaram e lutam por liberdade.

Oxalá o vento da liberdade possa inspirar o bloco dos guerreiros e guerreiras de  Zumbi, Dandara, Tia Ciata, Luiz Gama, as mães e senhoras dos santos, da cultura e do conhecimento, João Cândido, Carlos Marighella, Oliveira Silveira, os Lulas da Silva e as Marielles Francos. Oxalá consigam se livrar de todas as dificuldades impostas à liberdade, à igualdade e à fraternidade humana.  Nossos ancestrais guerreiros e guerreiras  nos  recordam  os passos  e os marcos  da luta  que vem de longe e os seus princípios éticos  tecidos na resistência  negra  nos encorajem a dizer aos colonizadores do passado e presente que estamos na escuta e alerta as  narrativas  de colonial.

Chegamos à segunda década do século XXI e depois da humanidade conhecer e sobreviver à pandemia da covid-19, nada será como antes. A independência, a autonomia e o esforço  se destinam a   ressignificar a vida, as efemérides e deixar `a juventude  narrativa sinceras. Nessa perspectiva conclamamos o protagonismo humano  nas ruas, a diversidade dos grupos sociais, o   respeito a história e a memória.

Com estas palavras encerro e convido ao diálogo e à reflexão permanente:  vamos  colocar nosso bloco na rua e  cantar aos quatro cantos  que as festividades oficiais das datas cívicas  não serão  encaradas como  comemorações  efêmeras ? Cidadãos e cidadãs de bem com a vida  estão  nas ruas construindo  a história  da resistência negra.


[1] Este artigo  da autora é uma nova versão do  texto original da  publicação: MERIJE, Wagner – Sol do novo mundo: fatos e curiosidades  sobre a Independência  do Brasil e outras guerras e revoluções que impactaram o mundo, São Paulo, Aquarela Brasileira Livros,  2022, págs. 146 – 149.

[2]  Gevanilda Santos nasceu em Presidente Prudente, cidade do interior do Estado de São Paulo, filha de migrantes negros nordestinos da cidade de Rio de Contas, na Chapada da Diamantina, Bahia. Mudou para a capital de São Paulo em 1968. Graduada em história e mestre em sociologia política pela PUC-SP, professora universitária aposentada, pesquisadora das relações sócio raciais, ativista da Soweto Organização Negra e autora de vários livros, entre eles Relações Raciais e Desigualdade no Brasil, publicado pela Selo Negro Edições, e, coorganizadora do livro Movimento Negro Unificado: a resistência ‘’

[3] Com os  novos estudos historiográficos que apontavam a ausência da participação popular na República Brasileira  a chamada história dos vencidos ficou mais evidente

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